Por: Adulai Indjai
Um povo não se qualifica pela sua classe política, não obstante o importante papel que tem na construção e na afirmação do Estado e da Nação. Particularmente no caso da Guiné-Bissau, país jovem onde existem carências de toda a ordem e natureza, com muita coisa incompleta ou por fazer no sentido da concretização dos sonhos elementares do povo, que não se resumem apenas no acto da conquista da independência – ter um hino e hastear uma bandeira – a classe política não é o espelho do povo não reflecte minimamente a sua essência.
Daí que, é imprescindível uma que se trabalhe ou se faça uma formação sólida da consciência nacional.
O exercício da democracia exige que a população estabeleça critérios que lhe permitam escolher em quem votar; ter conhecimento da trajectória na vida pública dos candidatos; fazer a pesquisa atenta do nível de coerência entre discursos propagandísticos e as ações políticas.
Por isso, a consciência democrática, que surgiu primeiro na sequência do término da dominação colonial e posteriormente com a queda do monolitismo partidário, tem vindo a crescer extrapolando da minoria que detinha o poder para as grandes massas. Mas, o caminho a percorrer ainda é longo, as barreiras a superar são inúmeras como provam as cíclicas ondas de instabilidade que têm flagelado este país. Presentemente nota-se alguma consciência está a materializar-se através das acções dos movimentos da sociedade civil organizada, estudantes, moradores, intelectuais, artistas, religiosos, órgãos de imprensa, em todos os pontos do país.
Essa consciência deve prevalecer para que a violência não seja solução efectiva para qualquer mal-entendido mas, antes, pelo contrário, para que demonstre que deve haver boa vontade entre os cidadãos. Nada é eterno, muito menos os conflitos sociais como os que têm penalizado o país fundamentados em parâmetros egocêntricos orientados por interesses escusos de uma ínfima parte da sociedade mas cujo poder de agitação e manipulação tem efeitos destruidores.
É entendimento de muita gente, que a democracia tem sido usada como um “supermercado de ideias” que são comercializadas mundialmente pelas potências ocidentais. Como tudo o que chega em África, depois de adquiridas, são adaptadas em função de realidades específicas e, consequentemente implementadas, na esmagadora maioria dos casos, em bases fraudulentas.
No contexto social, político e económico em que se encontra inserido o povo da Guiné-Bissau a democracia é um regime político que, em vez de gerar confiança, credo em paz, estabilidade, progresso e desenvolvimento, gera incertezas, medo, entre outros sentimentos negativos, devido à actuação desregrada dos actores políticos que confundem o dever de bem servir com o culto da meritocracia para alcançar o poder, criar riquezas e perpetuar-se nele.
Em qualquer sociedade, seja ela desenvolvida ou subdesenvolvida, existem divisões que surgem quando a meritocracia é aplicada incorrectamente, mas, sobretudo, quando se baseia no nepotismo ou em critérios étnicos, religiosos ou qualquer outro de índole divisionista.
Bem vistas coisas, caso no concreto da Guiné-Bissau, pode-se dizer que a meritocracia é uma das maiores paródias da nossa jovem democracia, porque a classe política depois de obter nas urnas a confirmação para exercer o poder público em favor do povo, assume-se como uma elite. Por isso, torna-se ingrata, exerce o poder de maneira irresponsável, precisamente, porque os membros não se reconhecem no povo votou.
A crise política que paralisa a Guiné-Bissau desde 2015 é prejudicial apenas para o povo, e não para a classe política; se fosse caso inverso, há muito que teria sido solucionada.
Assistimos neste preciso momento, uma guerra institucionalizada pela meritocracia; quem merece mais do que outro o lugar de vice-presidente… Quando é que vamos ter um primeiro-ministro? O governo do povo será útil ou de meritocracia minada em vícios que complicarão o funcionamento do aparelho do Estado e do poder público em geral? As múltiplas questões não preocupam a classe política da Guiné-Bissau, não por falta de consciência, nem tão pouco por imaturidade política. O fiasco político que se vive desde 2015 tornou-se tão evidente que a procura crónica de uma solução viável e rápida apesar de aparentemente envolver todos os extractos sociais não avança no sentido positivo.
Não devemos ficar surpresos pelo impasse político que dura desde a constituição do parlamento para a X Legislatura. O comportamento democrático exemplar que o povo da Guiné-Bissau demonstrou no dia 10 de março, não pode ser julgado inútil, porque, no exercício da democracia o povo é o patrão, ele é que dá o poder aos políticos para governar. O Povo cumpriu o seu dever.
A questão que se coloca é a meritocracia reivindicada pelos políticos. Podia ser considerada como uma idiotice, mas não é o caso aqui. Estamos a viver a continuidade da guerra do egocentrismo que, é, em todo o caso, um grave problema da democracia na Guiné Bissau, um pequeno país onde todo mundo acredita que o mérito é o único factor que pode levar um homem a ocupar um posto importante. Mas, a meritocracia guineense reside no diploma obtido no banco da escola. Quer dizer, a inteligência escolar sobrepõe-se ao saber fazer.
Uma opinião pública mal informada e mal formada
Como é que se pode fazer coabitar um povo mal informado com uma classe política centrada nos seus interesses privados? O milagre podia existir se a nossa classe social (média) fosse capaz de obrigar os políticos a respeitarem a escolha de quem ordena – o povo.
A situação em que se encontra o país é grave e preocupante. O diálogo é necessário e útil, mas o fundamental é conseguir criar um espaço adequado que permitirá aos políticos encontrarem uma solução ideal, para não dizer perfeita, para superar o actual estado em que se encontra a Pátria de Amílcar Cabral.