Por Carlos Vamain
Da passagem do Partido-Estado para o multipartidarismo na Guiné-Bissau, a partir de 1991, o constituinte guineense, em nome do povo, optou pelo sistema político semi-presidencial na sua Lei Fundamental que constitui, a partir das revisões pontuais operadas entre 1992 e 1993, o ordenamento jurídico-político do Estado.
Ora, este sistema político caracteriza-se pela combinação dos elementos do sistema Presidencial com os do sistema Parlamentar. Já no nosso caso, com forte pendor presidencialista, ao outorgar ao Presidente da República a competência de presidir, quando enteder, o Conselho de Ministros (Artigo 68º, alínea m), da Constituição da República da Guiné-Bissau).
Contrariamente, aos sistemas políticos semi-presidenciais das Repúblicas de Cabo Verde e de Portugal, nomeadamente, o sistema político guineense aproxima-se, neste particular, ao do sistema político semi-presidencial da República Francesa. Neste último, o Presidente da República preside o Conselho de Ministros ex-officio, não sendo como o nosso que atribui um poder discricionário ao Presidente da República para o efeito.
Por conseguinte, torna-se evidente, à luz do princípio da legalidade que rege o direito público segundo o qual nesta matéria não se presumem direitos, nem obrigações, que o Primeiro-Ministro, sendo Chefe do Governo compete-lhe igualmente, nos termos da CRGB, presidir o Conselho de Ministros. Uma situação que é incompatível com o exercício do poder constitucional do Presidente da República que o preside quando entender, conformando-se assim com o espírito e a letra da Constituição.
Convém sublinhar que o sistema político adoptado pela Guiné-Bissau não obstante ter instituído o princípio da separação de poderes, (Artigo 59º, da Constituição da República da Guiné-Bissau), para o funcionamento normal e regular dos poderes estabelecidos pela Constituição, torna-se indispensável a colaboração entre si e, que incumbe aos actores polítcos no exercício das suas funções.
Se não, vejamos:
- Quem cria e extingue ministérios e secretarias de Estado, sob proposta do Primeiro Ministro é o Presidente da República, conforme o disposto no Artigo 68º, j), da CRGB;
- Quem nomeia e exonera o Primeiro Ministro e os restantes membros do Governo, tendo em conta os resultados eleitorais, ouvidas as forças políticas representadas na Assembleia Nacional Popular é o Presidente (Artigo 68º, al. g), da CRGB);
- Quem promulga as leis, os decretos-lei e decretos, sendo estes dois últimos aprovados pelo Governo reunido em Conselho de Ministros é o Presidente da República (Artigo 68º, al. s), da CRGB);
- Quem nomeia os embaixadores, ouvido o Governo, sem carácter vinculativo, é o Presidente da República.
Donde, a imperiosa necessidade de, neste sistema, haver, sobretudo, uma colaboração institucional entre o Primeiro Ministro e o Presidente da República, para que o Governo possa efectivamente governar e implementar o seu programa apresentado ao eleitorado e sufragado por voto maioritário na Assembleia Nacional Popular.
Assim sendo, por força da Constituição da República, convém sublinhar que o Governo é duplamente responsável politicamente perante o Presidente da República e perante a Assembleia Nacional Popular (Artigo 103º, da CRGB) e neste caso em espécie, compete ao Primeiro Ministro, na qualidade de Chefe de Governo, informar o Presidente da República acerca dos assuntos respeitantes à condução da política interna e externa do País. Em suma, no nosso sistema político é indispensável que haja, repita-se, uma colaboração institucional entre o executivo bicéfalo instituído pela Constituição da República, a saber, Presidente da República e o Primeiro-Ministro como condição sine qua non para a promoção da estabilidade e desenvolvimento socio-económico e cultural do país. Pois, a própria palavra coabitação expressa o convívio pacífico e não o contrário.